25 de fev. de 2010

Vivo no meu mundo



Esqueça a sua história. Eu sei quem você é. Você é mais um. Sem mais, nem menos, apenas igual, mais um, no meio de bilhões, é apenas mais um. Portanto, esqueça a história, porque a história é apenas um conjunto matemático de variáveis que o trouxe até aqui, um conjunto limitado de perguntas e respostas de opções simples, sim ou não, que se finda em um resultado exato, o “aqui”. Nada mais do que isso. Liberte-se daquilo que você não tem controle. Esqueça a sua história. Não acho estranho limitar o presente a uma série de opções em que você escolhe apenas sim ou não. Eu não quero te curar, eu não quero te entender, mas talvez por um dia apenas você pudesse esquecer a sua história. Ignore a vida real. Ignore tudo a sua volta, ignore o noticiário da televisão e dos jornais, ignore a falta de segurança que ronda a sua casa, ignore o risco de morrer por uma bala perdida ou por um irresponsável no trânsito que decidiu afogar as mágoas criando um problema ainda maior. Perca a memória por um instante, e que esse instante seja longo demais, talvez eterno. Muitas pessoas passam a vida inteira torcendo para que algo aconteça, faça acontecer. Esqueça a história, ignore a vida real, perca a memória. Nasce com sua idade de atual, zere a sua vida, zere os seus sentimentos, zere aquilo que não faz mais nenhum sentido. O psicólogo me diz sempre que a sanidade vai me fazer feliz. Eu não acredito. Ele tenta em demasia me trazer de volta para o que ele chama de “nossa realidade”. Não entendo esse termo. Os olhos do cego são as mãos, e nem por isso a sua realidade é errada. Não conseguiremos nunca alterar a realidade de um cego, não podemos forçá-lo a olhar para frente quando não há nada que ele possa fazer a não tatear o ambiente. Qual a realidade ideal para o cego? Por que eu não posso, também, ter a minha realidade, o meu tipo ideal de vida? Ouço dizer que não sigo bem o trajeto que a vida faz, mas quem é a vida para me traçar um caminho a ser seguido se eu posso, muito bem, fazer uma nova trilha, fazer um novo percurso? Eu não faço nada para que as pessoas tenham medo de mim, mas as mesmas continuam dizendo que eu sou incapaz de perceber que o que eu fiz não vai fazer bem para mim. A vontade é de gritar e dizer que vivo no meu mundo e hoje eu sou feliz. Sair para trabalhar às 7h da manhã em um emprego que eu odeio para comprar coisas que eu não preciso e nunca me divertir ou ter divertimento sem proporção nenhuma com a quantidade de trabalho que eu acumulo. Quem é louco aqui? Por que eu devo voltar a realidade e aprender, como todo mundo, a ostentar aquilo tudo que eu não poderei possuir? Quem é são aqui? Prefiro os meus olhos secos pela medicação excessiva que me dão, do que os olhos marejados de tão tristes e preocupados com algo que eu não tenho a mínima intenção de fazer, que nunca desejei fazer. Quer trocar a minha vida perfeito pelo seu mundo decadente que para mim nunca existiu. Convenhamos, o louco sou eu ou todos vocês? Estamos todos presos, vocês só tem um pátio maior para o banho de sol. Você apenas não consegue enxergar as grades.